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17
Mar 2012

Motivos que originam más traduções em software

Tendo como língua materna o português, gosto de usar o software nesse idioma. Fico sempre feliz quando um software me oferece nas suas opções, ou por omissão, a respetiva tradução da interface para português. Ou quase sempre. Quase porque, por vezes, as traduções são de fraca qualidade, tornando as ações a desencadear por meio da interface difíceis ou impossíveis de adivinhar sem experimentá-la primeiro.

Ao longo da minha experiência de utilização de interfaces como utilizador, e também como tradutor voluntário para projetos de software sem fins lucrativos, deixo aqui alguns dos motivos que me parecem ser responsáveis pela fraca qualidade de algumas traduções.

Aliciar público inexperiente a traduzir aplicações a troco de algo

Oferecer prémios ou remunerações publicamente pela tradução de um software pode dar mau resultado. É, sem dúvida, uma boa forma de angariar tradutores que necessitem de um incentivo extra, ou mesmo pessoas que nunca traduziram software, mas até têm conhecimentos para o fazer; desta forma, o seu trabalho é valorizado. Por outro lado, também atrai pessoas cuja intenção é apenas ganhar qualquer coisa a troco de nada. Este tipo de público apenas tem interesse na recompensa, e negligencia a qualidade da tradução final.

Falta de testes com a tradução integrada no software

Uma tradução, embora feita com todo o cuidado durante o seu desenvolvimento, pode revelar-se desastrosa se não forem efetuados testes no software. Por exemplo, na tradução a partir do inglês, existem palavras ambíguas que, quando estão isoladas, podem referir-se a um verbo/ação ou um nome. Por exemplo, a palavra “download” pode referir um ficheiro que foi transferido, ou o ponto que desencadeia a ação de transferi-lo da Internet. É importante fazer sempre testes com a tradução aplicada na interface para averiguar esta situação. Adicionalmente, na traduções que recorrem a GetText (ficheiros po e pot), o programador pode colocar um comentário a descrever a situação, eliminando a ambiguidade.

Outra situação a rever é o número de carateres na tradução. Nem sempre os campos de texto são flexíveis, e uma tradução com mais carateres pode sair fora dos limites definidos, ficando a tradução cortada ou por cima de outros elementos da interface. Uma solução rápida pode passar por abreviar algumas palavras comuns, por exemplo, “para” pode passar a “p/” ou “avenida” passar a “av.”, mas com cuidado: traduzir palavras chave relacionadas com a aplicação não é boa ideia. Por vezes, a melhor alternativa é reformular a tradução para se adequar aos espaço limitado.

Vocabulário sem pensar nos utilizadores

Para poupar tempo, alguns tradutores recorrem a dicionários ou tradutores online, de modo a obter rapidamente um termo, o que é uma boa ideia. O problema começa quando o tradutor aceita cegamente a tradução que lhe é oferecida, sem pensar no contexto da aplicação.

Traduções literais também não são boa ideia na maioria das vezes. Uma tradução de software passa não só por traduzir o texto, mas também por efetuar a sua respetiva localização, isto é, alterar a expressão do texto para se adequar ao idioma para o qual se pretende traduzir, e manter o seu significado.

Trabalhar de forma colaborativa, mas desordenada

Uma tradução pode ser executada mais rapidamente se for feita em grupos de tradutores, usando o modelo de dividir para conquistar (cada um faz uma parte e junta-se à tradução final). Um problema que pode surgir é a falta de acordo para os termos traduzidos. Por exemplo, não acho aceitável que numa aplicação o termo “download” seja traduzido num lado como “transferência” e noutro ponto como “descarga”: se o contexto é o mesmo, então deve ter a mesma designação.

Também podemos ver o caso de traduzir o manual da aplicação. É essencial que o mesmo esteja de acordo com o software, para que o utilizador saiba exatamente como tem de proceder para realizar uma ação. Se a tradução do manual não estiver em concordância com a tradução do software, o utilizador pode ter problemas em seguir as instruções, e nesse caso, o manual torna-se inútil por culpa da tradução incorreta.

Verbos gerados a partir de marcas

Algumas marcas usam o seu próprio nome para descrever ações no site. Por exemplo, imaginemos um motor de busca chamado “Maapple”, cujo botão de começar a busca tem como texto “Maapple it!”. A tradução destes termos pode revelar-se terrível: por um lado, pretende-se efetuar a tradução para que as pessoas percebam a relação da marca com a ação no site, e por outro, não se quer quebrar o sentido que o autor da aplicação que transmitir. Não é uma questão fácil, e acho que tem de ser analisada caso a caso. Neste exemplo, talvez a tradução “Procurar com o Maapple” fosse aceitável, embora quebrasse o sentido do texto original (marca como ação).

 

Deverão existir mais motivos para falhas de tradução de software, mas estes são os problemas com que me deparo com mais frequência enquanto tradutor ou utilizador de software traduzido. São pequenos problemas que podem levantar grande obstáculos entre o utilizador e o software, quando a intenção é precisamente o inverso.

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